quinta-feira, 27 de setembro de 2007

na esplanada, a beber café

enquanto falava ao telemóvel, ela fumava, sorria. e olhava com insistência para a aliança de casamento. um enigma pela manhã.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

rumor

sei que vem aí o inverno. vejo as árvores a entristecer. sinto os primeiros arrepios, os primeiros espirros. as roupas mudam e a cidade vai perdendo aos poucos a sua luz ao final da tarde. é a mudança, amor. e tudo muda menos tu. há um outono que sempre nos surpreende. que nos rouba de súbito o verão. que nos deixa assim, a sós. e as palavras vão sendo cada vez mais silenciosas. um suave rumor antes das grandes chuvas. da água que lavará as pedras sujas da minha rua.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

estrangeiro

aprendes a viver em qualquer cidade menos na tua. conheces os nomes das ruas mas as pedras que pisas são sempre insuportáveis. percorres os caminhos um por um mas nenhum te leva aonde queres ir. são bairros e quarteirões que se transformam em súbitos labirintos da dor. gostas da luz mas até as avenidas podem entardecer ao meio-dia. és estrangeiro a cada instante e desejavas sempre estar noutra cidade qualquer. para talvez no exílio teres saudade da vida. e a distância se transformar num respirar de regresso.

sábado, 15 de setembro de 2007

desequilíbrio

disseram-me hoje que o meu mal era falta de equilíbrio. entre o sentir e o fazer. respondi que faço aquilo que sinto. ou melhor. que sinto aquilo que faço. lugares-comuns à parte, não me sinto desequilibrado.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

quietude

se eu morrer, um dia, não quero que digam que fui uma alma inquieta. eu sou quieto. não por a vida passar e eu não a agarrar. mas por tentar desesperadamente que ela pare. e a vida nunca parar.

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

pátio

certa noite vamos lá fora e o mundo parece que assusta. mas é tudo a brincar. e a eternidade é uma cama onde repousamos todos os dias.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

da chinelagem

tranquilizo-me sempre quando descubro que alguém que cresceu no mesmo sítio que eu também não perdeu a capacidade crítica de discernir que o uso avulso e despropositado de chinelos não cessa de nos supreender e irritar. há, sem dúvida, um problema de Nação. de que país queremos ser. e não me venham dizer que a culpa é brasileira. o grito de ipiranga já tem as barbas brancas.

fim das férias

vejo as árvores quietas e o verão demora-se. não há maior prazer do que estas demoras inesperadas. ficar mais tempo do que se esperava. tardar em partir. deixar que o vento quente nos atravesse um pouco mais. sempre um pouco mais. as férias acabaram mas parece que se demoram na nossa pele. e o inverno da vida que teima em não chegar.